Por- Chico Santa Clara

Janeiro – Em Manaus, o poeta Thiago de Mello atravessou para a terceira margem do Rio Andirá e se transformou em um ser encantado. Estava com 95 anos da mais pura poesia, das mais belas crônicas e da mais lúcida consciência social. Não deixou um único herdeiro à altura. Em Brasília, o ator Arnold Schwarzenegger vai ao Congresso a convite de Paulo Guedes e promete baixar a inflação nem que seja na porrada.

Fevereiro – Em Manaus, um pivete de 9 anos entrou escondido em um avião da Latam e viajou sozinho de Manaus para Guarulhos (SP), o que dá uma ideia da facilidade de enviar “farinha branca que passarinho não cheira” para os sulistas endinheirados. Fica a dica. Em Brasília, o presidente Bostonaro resolveu cagar na cabeça da ZFM ao anunciar a redução do IPI para diversos produtos.

Somente após o Supremo Tribunal Federal (STF) enfiar um supositório no cagão foi que o governo retirou os produtos fabricados na ZFM da lista da redução do tributo.

Março – Em Manicoré, dois irmãos abestados de 6 e 8 anos ficaram perdidos na floresta durante 26 dias, se alimentando de bundas de tanajura e água da chuva. Por muito pouco não pegaram o beco do mais cedo. Em Brasília, a terça-feira gorda fez uma lipoaspiração num Hospital da Unimed e morreu na quarta-feira de cinzas. As causas da morte não foram divulgadas.

Abril – Em Manaus, quatro paraquedistas abestados foram surpreendidos por um temporal da moléstia e levados pelo vento na direção de Iranduba. Dois foram resgatados com vida, uma paraquedista subiu no balão do padre e um quarto segue desaparecido até hoje. Em Brasília, formou-se uma gigantesca fila de puxa-sacos no cercadinho presidencial, desesperados com a falta de ovos na capital federal!

Maio – O vereador Olímpio Guedes Olavo Júnior, de Tabatinga, morreu após ter sido baleado em Manaus. Como em Tabatinga não há bala perdida (todas conhecem o CPF da vítima), um marginal já foi preso suspeito de participar do homicídio. Em Brasília, o presidente Bostonaro comprou o Centrão inteiro a preço de banana, mas devolveu alguns deputados que vieram com defeito de fabricação (eram quase honestos!). O SNI não se pronunciou a respeito.

Junho – O indigenista Bruno Pereira e o jornalista britânico Dom Phillips foram assassinados no Vale do Javari porque denunciaram a pesca ilegal de pirarucu na região, feita por grileiros, madeireiros e traficantes. Desde então, três vagabundos foram presos por envolvimento direto com o crime. Em Brasília, o presidente Bostonaro culpou as vítimas de terem entrado no Vale do Javari sem proteção policial.

Julho – Centenas de dragas e balsas de garimpo ilegais tocaram terror na região do Rio Madeira, em Autazes, até a Polícia Federal e o Ibama deflagrarem uma operação que destruiu parte das balsas utilizadas para a extração clandestina de minérios. Os garimpeiros foram se queixar ao bispo (Edir Macedo). Em Brasília, Milton Ribeiro, ex-ministro da Educação, é preso em operação da PF sobre corrupção do MEC.

Ele disse que não tinha conhecimento que o pastor Gilmar e o pastor Arilton cooptavam prefeitos para oferecer privilégios junto a recursos públicos sob a gestão do FNDE ou MEC. Há quem acredite.

Agosto – Um venezuelano de 60 anos incendiou uma lotérica que fica dentro do Mercado Adolpho Lisboa e causou a morte de três pessoas. Segundo as investigações, o corno teria ateado fogo no local porque não conseguiu comprar formicida com guaraná para beber e acabar com seu drama existencial. Em Brasília, o Filho do Homem desceu da goiabeira por não aguentar mais o papo chato da Damares sobre mamadeira de piroca.

Setembro – Início do horário eleitoral gratuito, que só alguém sendo muito zé mané teria coragem de assistir. Em Brasília, dezenas de candidatos epiléticos se debateram na TV, enquanto em Manaus os candidatos gays deram tudo na reta final. Ainda não se sabe quantos foram eleitos.

Outubro – Em Brasília, o Brasil ganhou um carimbo no passaporte para voltar à civilização, após a eleição do Nine Fingers.

Em Manaus, o senador Dudu Cadeirudo fez um hat trick (perdeu três eleições seguidas para governador) e já pode pedir música no Fantástico.

Novembro – Em Brasília, teve pichação nova em muro no caminho entre os palácios da Alvorada e do Planalto: “É só uma erisipelazinha!”. Em Manaus, milhares de terraplanistas fizeram uma Feira Hippie na frente do Comando Militar da Amazônia, enquanto aguardam os extraterrestres que o levarão à cidade perdida de Ratanabá. O mau cheiro do lugar está começando a incomodar a população.

Dezembro – Em Brasília, há divergências na equipe de transição do governo eleito sobre a dancinha que Lula deve fazer na cerimônia de posse na Presidência! Em Manaus, o prefeito David Almeida, dando prosseguimento à campanha de humanização da cidade, está rebocando centenas de postes, hidrantes e orelhões estacionados nas calçadas. “A calçada é do transeunte como o céu é do condor”, filosofou o alcaide. Há quem acredite.

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O Portal O Ralho é composto por um grupo de artistas digitais que utiliza a política como fonte de inspiração. Dado o tamanho da bizarrice a política é humor próprio e porque é, em si, uma coisa engraçada. O humor, ao contrário, é uma coisa muito séria. Provo: a política é toda feita de dribles à imprensa, de desmentidos impossíveis, de promessas jamais cumpridas, de ilusão, enfim, enquanto o humor não engana ninguém: ou é engraçado ou não é, está ali no papel em exibição pública, nu e cru. Seríssimo. Por isso, os políticos em geral são bons humoristas enquanto os humoristas sempre foram péssimos políticos. Então o Ralho traz a visão contestadora, humorística e diária da realidade…

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