A volta de Trump, a tirania autorizada

‘Donald Trump trará tempestades de grande poder destrutivo, com mudanças na geopolítica e na economia internacional’, escreve Tereza Cruvinel

Por Tereza Cruvinel

Há uma diferença entre esta eleição de Trump e a de 2016: desta vez, a maioria dos americanos o elegeram sabendo perfeitamente quem ele é. E deram de fato a ele um poder sem precedentes, como se dissessem numa grande hashtag no X de seu amigo Musk: eu autorizo.

Autorizam o populismo autoritário e o racismo, a xenofobia e a deportação em massa de imigrantes, o negacionismo climático e a volta da delinquência ambiental, o negacionismo sanitário e a sonegação das vacinas, o boicote ao multilateralismo, a perseguição dos adversários e até o abandono dos aliados, como a Europa e sua Otan. Desta vez, tudo foi dito e bem ouvido.

Em 2016, Trump era de fato um outsider do sistema político, um rico empresário e homem de mídia que um dia anunciou, nas escadarias de sua torre em Nova York, que iria disputar a presidência. Muitos talvez não soubessem mesmo quem ele era e o que significava. Votaram nele porque eram republicanos, simpatizaram com ele ou tinham antipatia pela democrata Hillary Clinton.

Agora o elegeram e empoderaram tanto, sabendo que ele atentou contra a democracia quando perdeu para Biden em 2020 e articulou o 6 de janeiro. Sabendo que já foi condenado criminalmente uma vez e responde a três processos. Sabendo que, se perdesse agora, poderia haver outra tentativa de insurreição.

O poder que lhe deram agora inclui a maioria nas duas casas parlamentares, fora a maioria conservadora na Suprema Corte, formada pelas três indicações que ele fez no outro mandato.

Do alto de seu ego, cavalgando este poder como um novo Poseidon, Trump II trará tempestades com grande poder destrutivo, mudanças importantes na geopolítica global, na economia e no comércio internacional, com o recrudescimento do protecionismo e a imposição de tarifas a produtos estrangeiros.

Ditadores nem sempre chegam ao poder por golpes de Estado. Muitas vezes usam a democracia como escada. De alguma forma, esta eleição de Trump lembra a de julho de 1932 na Alemanha, em que o partido nazista teve uma grande vitória. Foi o mais votado (37%) embora não tenha feito a maioria no Parlamento. Em janeiro, após meses de instabilidade, Hitler foi nomeado chanceler. Daí para virar ditador foi um passo, e o resto nós sabemos.

Para nós, aqui na América do Sul, tão desimportante para a política externa americana, Trump pode significar o fortalecimento da extrema direita na região. Milei na Argentina e Bolsonaro no Brasil estão eufóricos. O argentino acha que seu governo desastroso pode ser salvo por Trump. Bolsonaro e os seus acham que ele poderá livrá-lo da inelegibilidade para poder concorrer em 2026. Ilusão. Para isso acontecer nosso Judiciário teria que dobrar o joelho e renegar a soberania.

Muitos sofrerão com a volta de Trump, mas estou pensando mesmo é nos palestinos de Gaza. Trump pode acabar com a guerra na Ucrânia para livrar-se de seu custo, mas no Oriente Médio nada fará pela paz ou a criação do segundo Estado. Netanyahu terá sinal verde para avançar com seu genocídio rumo à limpeza étnica que é seu real objetivo.

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